Em minha vivência com Laura...



Superar-se. Surpreender-se. Assustar-se. E, criar (se).
São tantas as coisas pelas quais passei nos últimos meses que me é difícil definir até o exato momento, qual meu estado real. Seja ele físico e/ou psicológico. Não sei se minha ficha já caiu, mas no fundo sei que ainda não. E assim foi, de repente. Não sei bem como as coisas sucederam, mas posso afirmar que, aconteceram de verdade. E muito rapidamente. Mais precisamente, em dois meses apenas. E por um instante me vi ali, no meio do palco. Sentada em um banco, com o coração pulsando fortemente no peito e diversas luzes voltadas para mim.



 A respiração ofegante e o suor escorrendo pelo corpo inteiro. Era o momento da minha estreia. Ou a estreia de Laura. Ou melhor, a estreia de ambas. Mas, para melhor entender isso tudo... Preciso voltar aonde tudo começou. Foi assim, de repente, por um convite do meu querido Diretor Carlos Marroco, em uma madrugada de não me lembro bem o dia, que recebi um convite desafiador. Havia acabado de estrear uma peça, dirigida pelo mesmo Diretor Carlos Marroco, onde tive uma participação de pouco destaque, quando de repente me deparei com esse convite.



O convite de um monólogo. Fiquei incrédula, e em seguida extremamente lisonjeada. Ao mesmo tempo em que passada a euforia do convite, me veio a conscientização da responsabilidade que iria enfrentar. Mas, seria um erro dizer não a um texto tão delicadamente complicado, bonito e completo. Um frio na barriga me tomou por completo, com algo me dizendo para aceitar. Afinal, o que teria à perder? E foi à partir dali que caí no mundo de Laura. Me arrisco à dizer que jamais li texto tão claro e ambíguo. Tão simples e complexo. Tão instigante e duvidoso. Tudo tão grande e pequeno. Não posso e não direi que foi fácil entendê-lo. Não foi. E ainda não é. Sinceramente, ainda há muito que entender. 



Me surpreendeu entrar no mundo de Laura em Eu Não Matei Carmen. Eu não tive como fugir. Entrar no universo de uma mulher cansada de doar-se tanto, de sempre ajudar o próximo e não ser ajudada, de jamais julgar e ser julgada, condenada. O que levaria uma pessoa "normal" à loucura? A carência? Falta de atenção? Sofrimento oculto? A que ponto chegaria alguém de caráter honesto, correto, disciplinado, responsável e amável? Laura sofreu as consequências do seu próprio abandono. Autoabandono. E não resistiu. Explodiu. E em um humor trágico, revelou e viveu em uma hora, o que nunca fez em toda sua vida. Libertou-se de si mesma. E eu, Clara Ferrari, tive a oportunidade de interpretar esse espetáculo teatral. Acompanhei seu desenvolvimento, seu crescimento. Desde a confusão mental da personagem até a minha própria confusão mental de texto. Me surpreendo à cada dia mais com a inteligência e sabedoria do meu Mestre/Diretor Carlos Marroco. Foi um trabalho no qual tive a oportunidade de crescer, de me desenvolver. Mas também de me determinar. Estudei técnicas de concentração, de meditação e preparação física. Me esforcei e reforcei. Foi bastante puxado, mas duplamente gratificante. Não me arrependo de nada. Cada esforço foi uma honra. Não foi fácil criar Laura... A sua complexidade, as suas manias, as suas singularidades, suas explosões de humor, e toda a bipolaridade da peça. Em dias quentes, o sacrifício foi muito maior. 


Estive tentada à desistir muitas vezes. Mas a paixão, o comprometimento e a responsabilidade não me deixaram. Eu não teria coragem. O processo foi árduo e rápido. Rápido sim, mas não fácil. E sendo assim, Laura surgiu. Dar a vida à Laura exigiu literalmente dar a minha vida. Tive que me entregar, me jogar e me surpreender. À cada dia de ensaio, à cada nova tentativa, surgia mais alguma ideia, mais alguma cena, mais um desafio, mais alguma criação do senhor Diretor Marroco (que diga-se de passagem, chamo-o de MEU Diretor). Confesso também, que houveram diversas desavenças internas, minhas comigo mesma. Medo de falhar, de fracassar, de não conseguir e se desiludir... E, no entanto veio a superação. Só nós sabemos o quanto foi difícil essa superação. E que fase difícil a que passamos juntos! Foi uma das maiores provas de que o que não mata, fortalece. Todo o processo de criação foi uma surpresa. Uma caixinha de Pandora. Se é assim que posso revelar a vida de Laura.
E é assim, e ainda está sendo, e será assim enquanto continuar.

Minha vivência com Laura se resume em superação. Surpresas e principalmente criações. 


“E eu atuei com entrega, paixão, desejo e dor. Fui moldada com paixão, entrega, sacrifício e crescimento.”


PS: Sou grata eternamente por este trabalho, que me moldou, me fez crescer e amadurecer como atriz. Sou grata eternamente ao meu amado Diretor Marroco, pela técnica, por toda a sabedoria, todos os estudos transmitidos para mim. Se hoje tenho algum reconhecimento profissional como atriz, devo todo o meu destaque e profissionalismo a ti, Marroco.
Também quero agradecer ao meu querido Produtor Rafael Fernandes. Vocês foram incríveis comigo. Nos mantivemos firmes e fortes o tempo todo. Foram meu porto seguro, meus alicerces, meus reis magos, meus queridos, meus colegas de trabalho e além disso tudo: Meus amigos. Sinto que ainda faremos grandes trabalhos juntos. Pois já fizemos excelentes trabalhos juntos. Eu adoro vocês!

Clara Ferrari

 28/02/2014



Fotos by Bene Collor