SOBRE A PEÇA "O ASSALTO" DE JOSÉ VICENTE

Na foto o ator Rodrigo Ximarelli





“Meu número é 5.923,800, você sabe quanta gente vem atrás e quantos não vão a minha frente?”



Vitor é um bancário como tantos outros. Vive em São Paulo e está à beira da loucura, “da loucura que leva ao suicídio”, cita o autor. Vive sufocado numa vida congestionada de trabalho, obrigações, ruas e metrôs lotados de gente que não tem nada a ver com ele. Sua vida é sem amigos e nem inimigos, vive apenas para servir ao Banco e ao sistema no qual o seu Maia “o chefe” abusa do poder para assediá-lo constantemente.



 “Imagina uma coisa monstruosa vinda da merda, que conseguiu tudo o que queria puxando o saco de tudo quanto foi gente importante. Imagina essa coisa dormindo com você, lá bem dentro do teu sono, dentro do teu copo de cerveja, dentro da tela de cinema, dentro do livro que você gosta de ler, e você tem que chamar a coisa de chefe.”



Vitor expõe seu sofrimento ao faxineiro do banco ao mesmo tempo em que o sacode com palavras para que perceba quanto o sistema o consome e o massacra. Suas palavras pedindo ao faxineiro para que não se torne um robô, para que pense no que quer fazer de sua vida, no que vai ensinar para seus filhos, etc., são os reflexos das fantasias do próprio bancário, abafadas juntamente com o sonho de fazer parte de uma categoria que há um tempo não é valorizada.



“Na sua profissão você é sacerdote e eu não sou na minha.”



Provocações, subornos, sexualidade explodem num ritual, no qual Vitor escancara todas as suas frustrações, medos e revolta. Ele não acredita mais em um reparo, banco nenhum pode pagar o tempo que perdeu nesses anos de dedicação, dentro e fora do banco. Sendo assim, puxa o gatilho de um exército inteiro contra a própria cabeça.



“Eu queria assaltar alguém por dentro, saber se é melhor ou pior do que realmente é?”

Evoé Cia de Teatro

Apresenta:

“O ASSALTO”

De José Vicente

Com Lucas Barbugiani e Rodrigo Ximarelli
Direção de Carlos Marroco

Dias 20 e 27 de novembro de 2011
Dias 4 e 11 de dezembro de 2011
Domingos às 20h

Local: “Estação Caneca”
Rua Frei Caneca, 384
Consolação
São Paulo – SP


MARROCO FALA SOBRE SEU MÉTODO DE TRABALHO





Foto by Márcio Desideri


Um breve histórico sobre minha carreira e como desenvolvi meu método de trabalho

Estudei, pesquisei e desenvolvei meu próprio método com técnicas de encenação e preparação de atores inspirado em grandes nomes de segmentos diversos, como: Psicologia, Filosofia, Artes Cênicas, Artes Plásticas, Cinema, Dança, entre outros. Utilizo técnicas intensas para extrair dos atores fortes interpretações, de modo a causar no público grande emoção. Minhas encenações são caracterizadas pelo resgate do teatro dramático com inspirações nos segmentos da arte expressionista, criando um clima tenso, e muitas vezes incômodo, como retrato de um lado mais cruel do ser humano, levando o público a vivenciar sensações e reflexão. Conquistei meu reconhecimento como Diretor Profissional por Seriedade e Mérito. Tive em minha carreira espetáculos que marcaram períodos de crescimento pessoal e profissional, com a confirmação e acertos de tudo que criei no decorrer dos anos. Cito os espetáculos: Corço (1998), Insensatez (2000), Se o sol me der bom dia (2001), O canto do cisne (2004), Insensatez – O julgamento de Medéia (2006), As bruxas do Desterro (2008) e O assalto (2011). Mais informações podem ser apreciadas no meu blog, onde constam todas as peças que dirigi. O endereço é http://diretormarroco.blogspot.com/


Como dramaturgo, desenvolvi meu próprio estilo literário, destacando sempre em minha obra o caráter humano e suas conseqüências. Possuo um conjunto de treze obras registradas na Fundação Biblioteca Nacional algumas inéditas e outras consagradas com prêmios de Melhor Texto Original, como o caso de “Insensatez” (Primeira história da peça “Marroco conta quatro histórias de paixão”) em 2000, “Se o sol me der bom dia” em 2001 e “Ausência” em 2004. Em 2010, publico meu livro “Trilogia da Maldade”.


Nós todos, em nossa sociedade, em nosso dia a dia, mostramos o melhor de nós, passamos a melhor impressão, mas todos temos um lado obscuro, torto, feio, extremo, que escondemos, às vezes até de nós mesmos. Nunca me interessou mostrar no teatro a vida bela, ou uma repetição “natural” da vida no palco. Eu sempre quis mostrar o que não é obvio, os sentimentos sufocados, o lado cruel e avesso do ser humano. A arte expressionista me deu elementos para desenvolver a minha criação.


Repetindo um pouco a época em que foi criado o expressionismo, a vida não é tão bela como se pinta, o mundo não está sob controle como se prega. A Arte não pode ser apenas bela, ou apenas divertir. A arte conta a história de um povo. Tem que atingir, educar, fazer pensar, ajudar, alertar.




Quando me tornei diretor tive a necessidade de criar uma identificação para o meu trabalho, partindo do princípio de colocar em cena resultados que levassem mensagens e reflexões ao público. Entendo assim a real função do teatro. Já havia conhecido, estudado e praticado técnicas habituais na preparação de atores, mas não acreditava em algumas delas, outras achava ultrapassadas. O ser humano se comunica primeiramente através do corpo, a voz vem sempre depois. Quando falamos “bom dia” para alguém, o nosso corpo já disse antes, revelando se realmente queria desejar o “bom dia”, ou não. No teatro não poderia ser diferente. Então, precisava fazer com que os atores interpretassem primeiramente pelo corpo. Comecei a buscar caminhos, criando exercícios onde o ator representasse as emoções com formas corporais. No início eram formas moldadas e relacionadas com a voz. Hoje, depois de anos de trabalho, e continuidade nas minhas pesquisas consigo fazer com que o ator dê essa forma ao corpo de dentro para fora, sinta realmente verdade e força, representando as emoções das personagens. Uma vez que o corpo representa o que o texto pede, a voz vem através desses impulsos e estímulos corporais. A partir daí desdobram-se exercícios para reforçar a interpretação e sustentação vocal.


Sim. Tudo começou com o estudo da arte expressionista e todos os seus segmentos. Fatores históricos e artísticos. Depois fui agregando: Filosofia, Psicologia, Psicanálise, Física Quântica, Filosofias Orientais, Dança, Butoh, Artes Plásticas e Música. E também, estudo de artistas contemporâneos que em algum momento usaram a mesma base de pesquisa.


Um dos temas recorrentes no meu trabalho é questionar a crueldade do ser humano. Extraio de todas as obras que trabalho mensagens subjetivas para causar reflexão no público. Se eu conseguir com que as pessoas saiam do teatro pensando, repensando suas atitudes, ou simplesmente refletindo, o meu objetivo está alcançado. O Objetivo principal é fazer as pessoas pensarem. A “arte” simplesmente para divertir não me interessa. O brasileiro está cada dia mais despolitizado, o desrespeito e a violência aumentam cada vez mais, tudo pela falta de informação e cultura. A contribuição que deixo é pequena diante da grande oferta de diversão por diversão, mas por onde passo sempre fica uma semente.


Estréio mês que vem “O assalto”, de José Vicente de Paula, dirigida por mim, onde retrata as tensões cotidianas, as aflições e angústias dos habitantes da Metrópole São Paulo, representados pelo bancário Victor e pelo varredor Hugo, ambos os funcionários do mesmo Banco, que se deparam a um final de expediente inesperado, se envolvendo num contexto de nuances de sentimentos, onde razão e emoção se confundem. O público será induzido a sentir e se auto-analisar, quando se deparar com as personagens da peça, seus conflitos, sua dor, seu dia a dia. Assim consiste o “O Assalto”, um espetáculo denso e dramático que almeja conquistar o público através de seu conteúdo consistente e polêmico, e de interpretações de qualidade.